sábado, 10 de setembro de 2011

Keynes, Miss Colegial e Fanfarra interminável

15h15min: Sentado à minha mesinha, cercado de livros e papeis, com grandes fones de ouvido pregados na orelha, começo a sentir o azedume irritadiço se alastrar pelo corpo.
A irritação brota pelo fato de estar tentando estudar macroeconomia e usar os fones, sem música alguma, para tentar amenizar o som calhorda de um miserável que esgoela ruídos porta-malas a fora do seu carro. Um batidão infernal a martelar e obscurecer, quando não confundir os detalhes sobre o papel da demanda agregada na teoria keynesiana.

Em pouco tempo estou paralisado observando as ranhuras da parede. A concentração foi esfacelada. Mas então o maldito dá uma trégua e, sem ousar pressa, volto os olhos para o texto, porém não me precipito. Espero. Não dá outra, o funk vem com potência demolidora dessa vez. É inevitável não sonhar: um lança míssil sem consequências. Apenas assentar a arma sobre o ombro, mirar e abater o inimigo para depois voltar a sentar-se como se nada tivesse acontecido.

Caprichoso e exibido, o sujeito utiliza-se de refinadas oscilações no volume para demonstrar a eficiência do seu aparato sonoro. Na condição de maestro genérico e ramerrão, alcança patamares elevados nos meus níveis de emputecimento. Não há para onde fugir.

Se conseguisse centrar-me, nessa situação, poderia ler Peter Sloterdijk durante uma carreata de comemoração do hexa campeonato brasileiro ou em meio a um incêndio. Esse raciocínio traz algum incentivo, servindo até mesmo como desafio. Pego os fones e volto à posição de labor.

“Em todo caso”, continuei a leitura, “no modelo clássico a política fiscal não afetava/ passeio de saveiro, rolezão pelo mundo /aumentos de impostos ou redução dos gastos correspondem/o que ela é? Mercenária! Mercenária!”. Hora do café.

Após fartar-me com o lanche vespertino e já mais do que farto com o barulho, pela primeira vez, vou até a rua ver se localizo o inimigo. Por incrível que pareça, o cara está longe. Lá do outro lado do rio. Investigo a área, casinha ribeirinha por casinha ribeirinha. Não encontro e volto.

Ao sentar-me novamente, os estrondos simplesmente cessam. Talvez o Tião Gente Fina tenha me visto com ares revoltos escrutando a região e resolveu baixar a bola, ou quem sabe foi abatido por um aliado. Na verdade, o mais provável é ter ido aproveitar o absurdo dia de sol sem nuvens em outro canto. Não interessa.

Horas depois, reverberações emboladas e tímidas surgem do Centro Eventos vizinho. Estão passando o som. Enquanto mordia uma maçã em frente de casa, mal imaginava que aquilo seria outro inferno, senão pior, que me deixaria impossibilitado não só de estudar, mas de poder dormir.

Este texto é minha singela homenagem a Miss e Mister colegial, eleitos lá pelas onze da noite e que, certamente, comemoram junto a sua torcida até agora: 3h50min da manhã. A vocês, parâmetros estéticos colegiais de nossos dias, meus parabéns.

P.S.: Gostaria de agradecer, também, por alegrar a minha noite e trazer felicidade à rua, ao pessoal que está na casa noturna Martinhos. Principalmente aos imberbes minimante suscetíveis aos efeitos do álcool a quebrar garrafas e buzinar aqui pelas imediações.

P.S.2: 07h20min, rapazes descem a ladeira estrondando tambores em direção ao Centro Eventos e me lembram que os desfiles do dia sete de setembro foram transferidos para hoje. Sendo ao pé do morro a concentração de pancadas animalescas e acima, ao lado da prefeitura, do resto do pessoal que vai marchar. Mudo de quarto. Não adianta. Parece mentira. Dessa vez o lança míssil seria insuficiente, devido à dispersão do inimigo. O devaneio me leva a imaginar que ideal seria subir num trator com pá carregadeira e ir recolhendo as pessoas pelo caminho, despejando-as longe daqui.

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